segunda-feira, 27 de outubro de 2014

Dizer amo-te em 164 línguas diferentes

"se oiço mais um hipster
dizer que a arte está morta
invocarei shakespeare do reino dos mortos
para o poeta lhe dizer
porque gostaria de ter tido
uma conta de gmail.
no dia a seguir a ter ensinado a minha mãe
a enviar imagens do iphone
ela enviou-me uma fotografia desfocada
do nosso cocker spaniel
dez vezes de seguida.
não te atrevas a dizer-me que isso não é lindo.
o van gogh teria tirado 20 selfies por dia.
a sylvia plath teria enviado sms's aos seus amantes
com smileys com corações nos olhos
quando ficasse sem palavras.
o andy warhol faria os vines
mais estranhos do mundo
e todos os veríamos de manhã
enquanto enviamos as nossas bebidas
por snapchat
às pessoas que gostaríamos cujos lábios
estivessem contra os nossos
(em vez de capuccinos).
o mundo está cheio de crianças de 7 anos
a aprenderem a tocar guitarra
com os vídeos do youtube.
nunca mais vou ter medo de esquecer
o som da voz do meu avô.
nunca mais terei de imaginar
como soam os australianos
ou como é que os gafanhotos procriam.
continuarei a tirar fotografias a túlipas
em parques públicos
com o meu telefone
e tu continuarás a gozar com isso
mas não faz mal.
só espero que um dia percebas
como tens sorte em estar vivo num momento
em que podes procurar no google
como dizer amo-te
em 164 línguas diferentes."


b. e. fitzgerald

terça-feira, 7 de outubro de 2014

Jean-Jacques Rousseau. In: “A Nova Heloísa”

"Todos se colocam freqüentemente em contradição consigo mesmos (…) e tudo é absurdo, mas nada é chocante, porque todos se acostumam a tudo (…) um mundo em que o bom, o mau, o belo, o feio, a verdade, a virtude, têm uma existência apenas local e limitada (…) eu começo a sentir a embriaguez a que essa vida agitada e tumultuosa me condena. Com tal quantidade de objetos desfilando diante de meus olhos, eu vou ficando aturdido. De todas as coisas que me atraem, nenhuma toca o meu coração, embora todas juntas perturbem meus sentimentos, de modo a fazer que eu esqueça o que sou e qual é meu lugar. (…) vejo apenas fantasmas que rondam meus olhos e desaparecem assim que os tento agarrar. (...) Eu não sei, a cada dia, o que vou amar no dia seguinte. Eu vejo apenas fantasmas que rondam meus olhos e desaparecem assim que os tento agarrar."


Jean-Jacques Rousseau. In: “A Nova Heloísa”

sexta-feira, 3 de outubro de 2014